Há muito tempo ele sustentava aqueles dois. Há tanto tempo que sequer se lembrava mais da última vez que tinha conseguido sorrir sem, logo em seguida, abaixar as vistas e aquela pontada de infelicidade lhe tingir a alma.
Medo de ser feliz outra vez, de abandonar aqueles dois para trás. Os dois. Ele só tinha a eles.
Tentava, afinal, manter a razão e se prendia ao pouco de fé que ainda lhe restava para não se atirar ao penhasco. Para ingrato não ser. Acreditava realmente que tudo o que tinha na vida dependia daqueles outros e, por isso, os arrastava para todos os cantos, como espectros imperfeitos.
Tantas vezes angustiado, matava sempre a si mesmo, mas nunca a eles. Era pressentido, porém, que a hora de saltar fora do barco não se delongaria e que talvez, então, ancorar-se em algum porto que fosse ao menos capaz de prestar socorro a ele, náufrago, seria o melhor acalanto. Derrotados. Presos uns aos outros por elos corrompidos.
Manhãs de angústia profunda lhe rompiam a face, tardes de letargia e inércia, era um vencido pela urgência dos afazeres que de nada aliviam o peso das horas. Noites perdidas deitado em camas diversas, com amores diversos e infinitos. Fazendo da luxúria, a compensação.
A exterioridade, no entanto, jamais lhe fora suficientemente convincente para superar a fraqueza que sentia por aqueles dois.
Olhava com atenção para todos ao redor em busca de amparo. Lembrava do passado como se todas as palavras, todos os sorrisos pudessem voltar a acontecer. E então se via sozinho. Percebia que tudo o que fazia era enganar a todos com suas promessas de amor maior. Por telefone assegurava-se de que teria alguém ao regressar de onde viera. Enquanto preenchia as horas em outros braços. E ali continuava a sustentar a vida, sobre os ombros viajantes.
O que não sabia, no entanto, é que pode ser demorada a ponto de parecer que nunca mais chegará... mas a mudança, essa um dia chega e, aí, quando não há mais laço algum que possa sustentar uma relação furada, contaminada por farsas escondidas em cidades distantes, os laços, esses se rompem.
E é neste momento que se percebe que havia um lado jamais conhecido, havia palavras que ditas que nunca foram verdade e que os jogos que eram jogados sempre iriam favorecer a vocês. A vocês dois, que cismavam em serem sustentados.
Há demoras que precisam serem esperadas. Há naturezas que precisam ser modificadas. E é neste ponto que a narrativa se confunde e terceira pessoa vira primeira e narração vira confissão.
Entenda bem. Só espero que jamais volte a aparecer na minha estrada. "Não mereces o afago nem de Deus, nem do Diabo".
( continua_
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' tem espaço na casa e no coração'- a poética é uma arte que se constrói com esforço e dedicação.